A vantagem brasileira é uma utopia precisamente definida pelo povo do País, quando insiste que “no Brasil surgirá uma sociedade que derrubará as barreiras de religião, classe e cor”. Quem não ouviu essa frase?
Esse projeto nascido da mestiçagem e da mistura cultural foi descrito por intelectuais como Gilberto Freyre, Darcy Ribeiro e tantos outros. Essa é a vantagem brasileira diante dos que dividem seu próprio povo em nações diversas odiando-se mutuamente, obrigadas por infelicidade histórica a conviver no mesmo território sob o mesmo estado. Esta é a nossa vantagem em relação aos estados que empregam o conceito de raça como premissa de sua identidade.
Por isso, é gravíssimo que se pretenda destruir a grande vantagem brasileira, por meio da introdução do conceito de raça em nossas leis. Radical é o “Estatuto da Igualdade Racial” que será votado em Comissão Especial da Câmara dos Deputados nos próximos dias. Racializa toda a economia, a saúde e a educação. Seu objetivo declarado é o de eliminar as diferenças entre negros e brancos, mas nada pode ser mais prejudicial a todos os brasileiros, especialmente aos de pele mais escura, do que a introdução do conceito de “raça” na legislação.
A tese do conflito de “raças” pressupõe imutável hierarquia entre os seres humanos ditada pela biologia e imposta pela violência. Com a derrota do nazismo, o conceito de raça foi rejeitado pela academia, mas não pela sociedade norte-americana, uma vez que consiste em um dos seus critérios centrais de organização
É nitidamente racista a associação entre o multiculturalismo e as supostas diferenças de visão do mundo entre “negros” e “brancos”, usada para justificar a promulgação de leis raciais no Brasil. Essa relação pode ser estabelecida nos Estados Unidos, onde foi construída uma identidade negra à parte, devido à rígida segregação espacial dos guetos.
Mas, ao contrário do gueto americano, não há nas favelas brasileiras distinções dialetais entre “negros”, “pardos” e “brancos”: a alimentação não é diferente; freqüentam a mesma igreja ou terreiro de Umbanda e pertencem à mesma escola de samba. Seus filhos casam entre si. Vencida a pobreza, a vida melhorará para todos, principalmente para os “negros” e “pardos”. Porém, leis raciais dificultarão a convivência entre vizinhos de cores de pele diferentes e, no futuro, o casamento de seus filhos. Poderão surgir comunidades distintas e antagônicas, devido ao acesso diferenciado a empregos, à educação e à saúde.
A nação espera que o Congresso rejeite as leis raciais que ameaçam a unidade do povo brasileiro, afrontam a cidadania e agridem a igualdade republicana.