A história da minha família se mistura à história de Brasília de uma maneira indissociável. Meus avós maternos se mudaram do interior de Minas para ca, com as três filhas, acreditando na empreitada de JK. E minha avó paterna, viúva, deixou o Rio de Janeiro com os dois filhos.
O destino de ambas as famílias foi o bloco K da 305 Sul. Minha história começou ali. Porque foi essa superquadra de Lucio Costa que promoveu o encontro e a paixão dos meus pais. Lá se vão 50 anos dessa história de amor…
Minha avó materna morou na 305 até o fim da vida, por isso eu tenho as melhores lembranças daquela quadra. Vivi, com minha irmã, uma verdadeira infância brasiliense, brincando embaixo do bloco, andando de bicicleta e explorando os cantinhos da Brasília-criança com a minha tia.
Lembro da casinha de boneca na casa dos vizinhos, que eram ninguém menos que os queridos Bianchetti. Eu saia do elevador no 4oandar e escolhia se entrava na casa da minha doce avó Zenaide, ou dos meus ‘avós postiços’ Dona Ailema e Professor Glênio.
Minha outra avó, Cecília Zarur, sempre foi uma referência muito forte na minha vida. Uma mulher à frente do seu tempo. Advogada, na época em que as mulheres nem costumavam trabalhar fora. Ela era pura vanguarda! Foi uma das primeiras procuradoras mulheres do país. Era linda, carismática, inteligente, cultíssima!
Dia desses, mexendo em antigos baús, meu pai encontrou velhas correspondências da minha avó. Preciosidades de outros tempos, de um outro Brasil. No meio dos papéis amarelados, muitas mensagens de Juscelino Kubitschek. As famílias eram amigas e se comunicavam por cartas.
Uma delas me chamou especial atenção. Nela o presidente JK, em fim de mandato, escreve: “sejam quais forem os rumos da minha vida pública, levarei comigo, ao deixar o honroso posto que me confiou a vontade popular,o firme propósito de continuar servindo ao Brasil com a mesma fé, o mesmo entusiasmo e a mesma confiança nos seus altos destinos”.
Servindo ao Brasil? Qual politico hoje, em tempos de lama e corrupção, pensa no país? A carta revela mais do que a postura íntegra e digna de um político que punha a ideia de nação muito acima de interesses próprios. Revela um Brasil que, como o próprio JK dizia, tinha altos destinos.
Como não amar esta cidade?
Brasília foi fruto desse tempo de esperança e desta cepa de gente. Lucio Costa, Niemeyer, Athos Bulcão, Burle Marx e tanto outros gênios imbuídos de um projeto que transcendia a visão do agora.
Assim também foi a proposta de uma educação de excelência na Nova Capital, que tinha as cabeças fantásticas de Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro em sua concepção. Escola Parque, escola classe, CIEM e a nossa Universidade de Brasília como um centro de notáveis.
Por mais que os anos de ditadura tenham embaçado o brilho dessa obra-prima chamada Brasília, os vestígios ninguém conseguiu apagar. E cabe a nós, brasilienses, nascidos aqui ou abraçados pela cidade, resgatar a verdadeira vocação da nossa capital – ser a síntese e o modelo do país.
Nesse aniversário de 58 anos, um agradecimento especial à JK, aos gênios criadores nas mais diversas áreas, aos candangos que fizeram a cidade concreta…
E às Cecílias, Zenaides, Bianchettis e tantos outros que tornaram esse sonho possível.