A Travessia da Espanha: De Leon ao País Basco

Leon tem a Catedral, o Parador e uma surpresa

A  luminosidade filtrada pelos enormes vitrais coloridos da Catedral de Leon talvez só encontre algo maior em Chartres. Imergir na luz colorida pelos vitrais e dela fazer parte é uma viagem espritual a outra dimensão. O parador de Léon é um belo prédio do século XVI. As primeiras visões de fora e de de dentro são impressionantes. O pátio é belíssimo.

Parador San Marcos em Léon 

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A surpresa é uma fantástica loja no centro da cidade, próxima à catedral, onde são expostos centenas de carrosséis, rodas gigantes, caixinhas de música, cavalinhos e muitas outras coisas movidas a corda, como na minha infância. São de lata, madeira ou pano. As caixinhas de música, aberta a pesada tampa de madeira escura, exibem uma delicada bailarina sempre a girar ao som da música.

Visão do Patío Interno do Parador San Marcos 

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A viagem ao Paraíso através da luz dos vitrais da catedral é seguida por outra, à infância, no encantamento do rodopio da bailarina. Fiquei imaginando que talvez exista, por perto, uma fabriqueta artesanal desses objetos enternecedores. Visualizei alguém como o Geppetto, o pai do Pinochio, ensinando o tradicional ofício de construir caixinhas de música e brinquedos de corda.

Catedral de Leon

%21cid_FotodeLeon_1_1.jpgFoto: Sandra Zarur

Leon não tem muito mais a mostrar. Depois de ver o Parador, a Catedral e à lojinha que não consta dos roteiros turísticos, o melhor é seguir viagem.

                                                                                                                             Visite Santillana Del Mar, mas passe ao largo do Museu de Altamira.

A cidade seguinte foi Santillana Del Mar. Nos arredores está a caverna de Altamira. Desde as leituras infantis do “Tesouro da Juventude” aprendi a admirar a arte pintada em seu teto. Os bisontes e os demais animais retratados são um marco da história da Arte.

Bisontes de Altamira

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Altamira, entretanto, é classificada como “pré-história” por anteceder à “história”, quer dizer à história da antiguidade européia. É uma epistemologia etnocêntrica, na medida em que as grandes civilizações africanas e americanas pré-colombianas não são consideradas exatamente como “história”. Tradicionalmente China e Índia são vistas pelos europeus como “civilizações históricas”, mas, com a ressalva implícita ou explícita do exotismo.

A história transmitida a nós, mestiços de migrantes europeus e asiáticos e de negros e índios, deixa patente a superioridade da Europa. Ali estaria o cume da civilização. Altamira é um marco importante na construção do etnocentrismo ocidental.

A visita à “cueva” está proibida, o que é compreensível para sua proteção física. Do lado situa-se um museu com uma réplica não muito convincente da caverna. Não tem a poeira milenar e é demasiadamente arrumadinha. A sensação é a mesma da transmitida por dinossauros de plástico.

Logo na chegada há uma vitrine de alto impacto visual, a holografia de uma suposta cena cotidiana de uma família em que pai, mãe e filho travam uma risonha e despreocupada conversa no idioma imaginário dos habitantes da caverna.

Altamira é considerada como o limiar da superioridade do homo sapiens sapiens  e, talvez, por esta razão, a aparência das pessoas representadas na holografia é a mesma dos representantes da classe média européia contemporânea, com alguma mudança no vestuário de peles, nos cabelos e na barba. A estatura, a expressão facial e a  tonalidade e textura da pele são as dos europeus atuais bem de vida. Os seres humanos holográficos do Museu são mais parecidos com esse europeu estereotipado do que com migrantes portugueses, cockneys ingleses ou pobres de qualquer país do continente. Os habitantes da caverna deveriam, na verdade, ter a pele castigada pelo tempo e uma aparência diferente das pessoas que vivem com aquecimento e ar condicionado.

O Museu deseduca ao transmitir estereótipos e até simples erros de informação. Na busca de uma imagem de normalidade alegre, a família representada é composta de pai, mãe e filho. É a família nuclear típica da sociedade ocidental moderna, não mais que uma exceção no quadro da diversidade humana. A família de Altamira, a partir da comparação com outras sociedades caçadoras, seria provavelmente composta de muitos indivíduos dos dois sexos e de, pelo menos, três gerações. Na vida cotidiana, os homens passariam a maior parte do tempo trabalhando ou se divertindo com outros homens e as mulheres com outras mulheres.

O restante do Museu apresenta a narrativa desinteressante de um evolucionismo de manual.

Já a cidade de Santillana del Mar é belíssima. As paisagens são absolutamente inesquecíveis.

Paisagem de Santillana del Mar I

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Há um monastério românico cujo claustro está dentre as mais bem conservadas manifestações daquele período. Os altos relevos nas colunas do pátio são incríveis.

Monastério de Santillana del Mar

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As ruas da cidade apresentam supresas que emocionam pela cor e forma.

Rua de Santillana del Mar

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Santillana tem a bruma e a temperatura amena do Norte ibérico. Construções de pedra de onde brotam as cores quentes  da Espanha

Santillana del Mar: Muro e Portão, cores espanholas

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                                                                                                                             Bilbao: o maravilhoso Museu Guggenheim vale a visita

Em matéria de arquitetura, o que existe depois de Brasília é o Museu Guggenheim de Bilbao.

Bibao: Museu Guggenheim 

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A cidade é interessante, mas não muito, e estão fazendo um grande esforço para que os visitantes permaneçam mais do que um ou dois dias, pois tudo o mais desaparece em Bilbao devido ao fantástico prédio do gigantesco museu.

Bilbao: Museu Guggenheim 

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As exposições de arte conceitual do Guggenheim são boas, mas também somem devido à maravilhosa revolução na arquitetura que o prédio inaugura.

Bilbao: Museu Guggenheim

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É uma importante ruptura na estética do ver e do fazer prédios públicos. Não ficaria surpreso se, no futuro, o Guggenheim de Bilbao for comparado à Catedral de Brasília, ao conjunto dos três prédios de Piza incluindo a torre inclinada, à Catedral de Chartres, ao Taj Mahal, ao Paternon ou às grandes pirâmides das antigas civilizações egípcia, maia e asteca.

Bilbao: Escultura Externa do Guggenheim 

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A outra grande atração de Bilbao, aliás, de todo o País Basco, é a culinária. A sofisticadíssima comida faz por merecer uma jantar, que será lembrado por muito tempo, em um dos caros restaurantes locais.

Bilbao: Museu Guggenheim 

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Nossa viagem terminou em San Sebastian, famosa por seu hotel Maria Cristina e por seu charme estilo Belle Époque. É uma cidade bonita e elegante. É um lugar para se andar pela ciade por um dia ou dois. As praias ficam vários pontos atrás das do Rio e de outros trechos do litoral brasileiro.

Hora de voltar ao Brasil.

Que bom! Estava morrendo de saudades de casa.

2017-11-06T16:40:31-02:00By |Viagem|